Por Felipe Ferreira Lima
O verdadeiro sentido do adjetivo “mito” tem sido deturpado nos últimos tempos. Na visão turva da atualidade, identificar um mito é tarefa árdua por indicar alguém cujas ações transcendem o senso comum, ultrapassam o curso do tempo e reúnem princípios coletivos que estão acima dos pequenos interesses mundanos.
Só fui me dar conta de que convivia com um mito quando adquiri maturidade suficiente para enxerga-lo. Descobri Egídio, o tio-avô de inúmeras virtudes, que no aconchego do seu lar recebia legiões de homens públicos interessados em ouvir conselhos e relatos da sua vida que se confundiam com a história recente do país. Dali, ele rebatia cada visão pessimista que pudesse surgir, relembrando fatos passados para nos fazer valorizar o presente, sempre com visão entusiasmada sobre o futuro. Quem o ouvia, não diria que ele teria todos os motivos para ser um pessimista amargurado. Além da infância marcada pela poliomielite que comprometeu sua locomoção física, perdeu o pai e o irmão assassinados em praça pública na sua terra natal, Timbaúba.
Política para ele era missão de corajosos, não profissão. Tanto acreditava nisso, que no auge da carreira como Juiz de Direito, desistiu do cargo para seguir a carreira política. Eleito Deputado Estadual, na década de 60, foi considerado “subversivo e perigoso” pelo Regime Militar que o cassou na tentativa de calar sua influente voz na defesa da democracia. Na Constituinte de 88, como Deputado Federal, foi uma das pontes encontradas pelos seus pares para sedimentar os valores democráticos no texto constitucional, com brilhante desempenho que atraia holofotes em todo Brasil.
O político, como dizia, deve ser “obreiro do tempo”, colocando-se para além dos interesses pessoais e momentâneos, acima das rinhas locais, dos rancores eleitorais e das discussões irrelevantes para o coletivo. Mitos como ele, que inspiram gerações, estão em extinção, mas eternizam-se em forma de vetores que iluminam o futuro.
Felipe Ferreira Lima é advogado, professor universitário e presidente do Instituto Egídio Ferreira Lima.
Fonte: Jornal do Commercio, artigo de opinião publicado na edição de 20/04/2022.