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TELEGRAM: censura ou garantia da segurança?

A recente decisão de Alexandre de Moraes, ministro do STF, de suspender o funcionamento do aplicativo de comunicação “Telegram” tem gerado questionamentos, principalmente pelo fato de que, a empresa Telegram Group não está respondendo as notificações da justiça, o que olhando inicialmente, parece algo sério, no entanto, a essa notícia tem outras camadas que merecem ser observadas.

Lendo a decisão na “Petição 9935-DF”, percebe-se que a Polícia Federal em Brasília solicitou as referidas medidas contra o Telegram, dada a sua dificuldade de obter respostas pelo aplicativo, e o Ministro Alexandre de Moraes deu uma decisão atendendo a essa solicitação. Ocorre que não se trata de uma investigação ou inquérito qualquer, estamos falando do “Inquérito do Fim do Mundo”.

Para você que não sabe, esse “Inquérito do Fim do Mundo” é aquela investigação que foi aberta e pedida pelo Ministro Alexandre de Moraes, inicialmente para investigar “fake news” contra o STF, onde é o próprio ministro que pediu investigação, é Alexandre que conduz as investigações, e é ele mesmo quem julga sozinho determinações de prisões, apreensões de computadores de jornalistas, bloqueio de redes sociais, enfim, o cabra denuncia, acusa e julga aqueles que bem entende.

Esse inquérito é extremamente criticável, e é uma aberração em nosso estado democrático de direito, na medida em que o STF na figura do ministro, criou na base da canetada e interpretação tendenciosa, a possibilidade de investigar questões que afetam o STF, ignorando em muito o Ministério Público Federal, e criando uma verdadeira via de censura judicial com decisões que, do ponto de vista técnico não se sustentam, sempre amparando restrições às liberdade, em anúncios de riscos à sociedade.

No caso do Telegram, segundo se lê da decisão dada nesse dia 18/03, o alvo real é o blogueiro Allan dos Santos, acusado pelo seu julgador, de estar divulgando “Fake News” contra instituições democráticas (o STF principalmente), tendo tido sua prisão decretada por Moraes, mas atualmente foragido nos Estados Unidos e com pedido de extradição. No entanto, como Alexandre Morares não consegue prender, nem julgar ou calar a voz daquele que ele acusa, atualmente bloqueou contas do jornalista, e agora resolveu suspender o Telegram para que Allan dos Santos seja calado pelos canais de comunicação.

Observe-se que Allan dos Santos já teve seus equipamentos de jornalismo apreendidos por determinação de Moraes, além do ministro ter determinado a derrubada do canal do youtube, retirada do ar do blog, coação ao direito de ir e vir, e o alvo atual é o Telegram, que não respondeu à polícia nem ao judiciário quanto à determinação de retirada da conta do jornalista do aplicativo.

Uma semana antes da decisão de Alexandre de Moraes, a Globo, através do fantástico, veiculou matéria jornalística, falando mal do Telegram, como se o aplicativo fosse responsável pelos crimes que possam ser praticados através do seu uso. Era claramente a imprensa querendo criar o cenário favorável à decisão de Alexandre de Moraes.

Ocorre que, mais uma vez, em nome de uma falsa segurança, defende-se um bloqueio de um aplicativo de comunicação para toda a sociedade, algo que o STF já havia dito ser inconstitucional na ADI 5.527 em 2020 no caso do WhatsApp.

No caso do Telegram, Alexandre Moraes, sozinho, decide contra os precedentes do STF, apenas para validar um inquérito que o ex-ministro do STF Marco Aurélio já considerava ilegal, contrário à constituição, e que claramente atende a interesses parciais de quem acusa, conduz a investigação, determina atos à PF e julga ao mesmo tempo.

A decisão de Alexandre de Moraes pode até jogar uma série de notícias que o Telegram é uma ferramenta que oculta criminosos, argumento raso e arriscado, na medida em que o problema não é existirem novas tecnologias de comunicação, o problema nunca deverá ser a o instrumento utilizado, a conta de rede social, ou a existência de um blog, o problema é o seu uso indevido, que deve perseguir a responsabilização do criminoso, e não punir toda a sociedade, ou macular direitos em detrimento da conduta de um acusado que um ministro do STF decidiu focar.

A decisão de Moraes de suspender o Telegram é inconstitucional, ilegal, não defende a segurança pública ou a sociedade, apenas camufla com ares de interesse público, a gana do julgador acusador de ter seus algozes punidos, mesmo que ainda em fase de inquérito inconstitucional, e mesmo não existindo sequer julgamento por parte da corte constitucional. Estamos sim perante uma censura dos veículos de comunicação ao lugar da responsabilização de forma processualmente correta de quem venha cometer qualquer crime no uso de tais liberdade.

Perde o direito à liberdade, perde a constituição, perde a seriedade com que deveria ser tratada a questão de crimes pelas fake news, descredencia-se ainda mais o STF, e o estado democrático de direito sofre mais um golpe por quem deveria preservá-lo.

Caio Sousa

Mestre em Direito Constitucional pela Universidade de Lisboa, Especialista em Direito Constitucional e Municipal, Secretário Geral da Comissão de Direito Constitucional do Instituto dos Advogados de Pernambuco – IAP.

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