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A Liberdade de Expressão nas Redes Sociais e o Controle Judicial do Debate Político nas Eleições

A era digital trouxe novos desafios para o direito eleitoral, especialmente em relação à manifestação do pensamento nas redes sociais. Em períodos eleitorais, a internet e, em particular, as plataformas de mídias sociais, tornaram-se palco de intensos debates políticos, e o Poder Judiciário tem sido frequentemente chamado a intervir nesses casos para assegurar a lisura do processo eleitoral.

Contudo, é essencial que essa intervenção judicial ocorra de forma ponderada, garantindo o equilíbrio entre a necessidade de regular a propaganda eleitoral e o respeito à liberdade de expressão, um dos pilares da democracia.

A liberdade de expressão é garantida pela Constituição Federal, especialmente nos artigos 5º, inciso IX, e 220, que asseguram o direito à livre manifestação do pensamento, sem censura. No ambiente digital, essa garantia tem uma aplicação ainda mais relevante, visto que a internet proporciona um espaço de amplo alcance e visibilidade para as opiniões individuais e coletivas.

Todavia, como já ressaltado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), esse direito não é absoluto. Exceções são previstas pela própria Constituição e pelas normas eleitorais, sobretudo quando há ofensas à honra ou à imagem de candidatos, partidos, federações ou coligações, bem como a divulgação de fatos sabidamente inverídicos, as chamadas “fake news”. Nessas circunstâncias, o Judiciário é chamado a intervir para resguardar o equilíbrio no processo eleitoral.

No controle judicial sobre o conteúdo veiculado nas redes sociais durante o período eleitoral, o TSE tem adotado uma postura de autocontenção. Isso significa que o Judiciário deve agir com extrema cautela ao analisar postagens, evitando que sua intervenção seja caracterizada como censura prévia, o que seria incompatível com o regime democrático.

Nesse sentido, cabe ao Judiciário ponderar entre a proteção à liberdade de expressão e a necessidade de coibir abusos, como a disseminação de notícias falsas ou ataques à honra de candidatos, que possam desestabilizar o processo eleitoral. A autocontenção judicial implica, portanto, em evitar qualquer restrição desproporcional à manifestação do pensamento, intervenindo apenas quando o conteúdo ultrapassa os limites da legalidade.

Um exemplo ilustrativo dessa questão pode ser encontrado na decisão do TSE no Recurso especial eleitoral 060043962, de Relatoria do Ministro BENEDITO GONÇALVES, onde o Tribunal negou provimento ao recurso de um eleitor que havia sido multado em R$ 5.000,00 por veicular propaganda eleitoral extemporânea negativa contra um pré-candidato ao governo do Espírito Santo. A decisão foi baseada em uma postagem que associava o pré-candidato a uma organização criminosa, em clara violação à honra e à imagem do político.

O Tribunal entendeu que a publicação, ao insinuar a ligação entre o candidato e o PCC, ultrapassou os limites da liberdade de expressão. Para o TSE, não basta que uma postagem seja enérgica ou crítica; ela não pode ser difamatória, desonrosa ou baseada em fatos sabidamente inverídicos. Nesse sentido, a divulgação de notícias falsas e discursos de ódio configuram ilícitos eleitorais e podem gerar sanções, como multas e a remoção do conteúdo.

Outro ponto importante abordado na decisão do TSE é a distinção entre a liberdade de expressão legítima e a propaganda eleitoral negativa. A propaganda negativa ocorre quando uma crítica vai além da discordância política e adentra o terreno da ofensa pessoal ou da disseminação de informações falsas com o objetivo de influenciar eleitores de maneira ilícita. Esse tipo de conduta pode ser sancionada mesmo que ocorra antes do período oficial de campanha.

Para configurar propaganda negativa, como decidido pelo TSE, é necessário que o conteúdo divulgado tenha como objetivo macular a imagem do candidato ou incitar o eleitorado a não votar em determinada candidatura, o que pode incluir o pedido explícito de não voto. Esse tipo de manifestação, que vai além da crítica política e entra no campo da injúria ou difamação, não é protegida pela liberdade de expressão.

Diante desse cenário, o equilíbrio entre o combate à desinformação e a preservação da liberdade de expressão é uma das tarefas mais desafiadoras para o Judiciário em tempos de redes sociais. Ao proteger o debate político legítimo, o Judiciário fortalece a democracia e garante que o processo eleitoral seja pautado por discussões de ideias, e não pela disseminação de mentiras e ataques pessoais.

No entanto, essa intervenção deve ser exercida com cautela para evitar que o combate à desinformação se transforme em censura indevida. As decisões recentes do TSE apontam para a necessidade de respeito à honra e à verdade nas postagens eleitorais, sem, contudo, restringir a liberdade de expressão legítima.

O futuro das eleições e da democracia depende desse delicado equilíbrio.

Por Brenno Ribas
Advogado; Doutorando em Direito da Universidade de Alcalá; Mestre em Ciências Jurídico-Publicísticas pela Universidade Lusófona do Porto; Especialista em Direito Eleitoral pela PUC-MG; Especialista em Direito Constitucional pela Faculdade Única; Corregedor Auxiliar da OAB/PE; Professor Universitário do curso de Direito da UniFavip Wyden; Pesquisador/Autor jurídico.

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