A Comissão Parlamentar de Inquérito, ou CPI como é chamada, é um instrumento político de investigação que nossa constituição assegura, para que deputados federais e senadores possam colher depoimentos, documentos, dados e ouvir testemunhas, a fim de apurar, tanto a prática de erros administrativos, possíveis crimes comuns e crimes de responsabilidade de autoridades federais, bem como apurar danos que tenham sido praticados por maus gestores ou por suas equipes no exercício de suas funções públicas, CPI que poderá acontecer também nos estados, quando provocadas por deputados estaduais, e nos municípios, quando solicitadas por vereadores, cada um apurando questões e irregularidades de prefeituras e governos estaduais.
Qual o resultado de uma CPI? Bom, a CPI ao final produzirá um relatório, que será entregue ao Ministério Público, o qual analisará o relatório e irá refletir/ponderar se durante a CPI foi constatado algum crime ou não, ou seja, a CPI pode não dar em nada, do ponto de vista judicial. Por outro lado, o relatório da CPI, tem um peso político, que pode dar gás para que outros políticos se convençam ou não de que deve ser feito impeachment de autoridade, ou cassação de mandato de um parlamentar, ou apenas para movimentar as ruas e tentar apoio político eleitoral, afinal, a CPI pode investigar, mas não é polícia, não é promotoria, não é juiz, são políticos, parciais, com lado, selecionados entre oposição ou governo para fazer a CPI acontecer.
Tivemos famosas CPIs no país, como a CPI dos Correios em 2005, onde ficou claro o esquema de desvio de verbas publicitárias de entidades ligadas ao governo federal, e que descortinou o mensalão petista, onde no governo Lula, restou descoberto que deputados eram pagos com esses desvios para votar com o governo, o que resultou na queda dos Ministro José Dirceu, Antonio Palocci e Luiz Gushiken, além de futuras prisões e condenações de deputados de vários partidos.
O período da CPI de 2005 contou com as cenas lastimáveis do caso “Dólar na Cueca” onde José Adalberto Vieira foi flagrado com US$ 100 mil dólares escondidos nas roupas íntimas, quando na época era assessor do deputado José Guimarães (PT-CE), irmão do ex-deputado e assessor especial do Ministro da Defesa José Genoino, ou o caso da ex-deputada Angela Guadagnin (PT-SP) e sua “Dança da Pizza” comemorando a não cassação do ex-deputado João Magno (PT-MG), no final, com dança da pizza, dinheiro na cueca, ministros em queda, escândalo revelado, o governo lulista se reelegeu e depois fez sucessora. O povo não ligou para a CPI.
A CPI da Covid19, tinha tudo para trazer uma contribuição de investigação e fatos para o povo brasileiro, afinal, temos os desserviços do Presidente ao politizar a vacinação, o seu mau exemplo e consequente obstáculo para a efetividade de medidas sanitárias nos estados, a inexistência de uma coordenação nacional de orientações gerais em diálogo e construção com os governos, não implantação tempestiva de políticas sanitárias de fronteiras/aeroportos, troca inconsequente de ministros da saúde por desalinho à sua visão política da pandemia, instalar um clima desagregador e de negação das consequências do vírus para a saúde das pessoas, tudo o que poderia ser explorado e apurado para responsabilização ou não do presidente e seu governo.
Ocorre que, a CPI da Covid19 é dirigida pelo que temos de pior do ponto de vista político, senadores com histórico de processos e denúncias, familiares de gestores estaduais, representantes dos resquícios da política coronelista, com comportamento inquisitorial, machista e longe de qualquer nexo cognitivo, traçando linhas narrativas que do ponto de vista jurídico não produzirão qualquer efeito, fazendo afirmações de fatos que desconhecem, querendo condenar presidente por ter pessoas o aconselhando, como se isso fosse errado, ou querendo decidir politicamente qual a linha cientifica é a certa ou errada no enfrentamento da pandemia.
Bom, essa CPI traz sim desgaste ao governo Bolsonaro, mas não é tanto assim, pois os destaque mesmo está na preocupação de senadores em ter seus vídeos (VTs) gravados para circular nas redes sociais, o tratamento desrespeitoso aos depoentes interrompidos em suas falas e contextualizações, senadores com perguntas retóricas de “SIM” ou “NÃO” que nada esclarecem e que em ambas as respostas apenas buscam reforçar o que já prejulgaram, receio dos parlamentares em ver governadores e prefeitos expostos na má/improba gestão dos repasses de verbas federais, discursos midiáticos próprios desse momento onde a população jamais irá acompanhar as horas de depoimentos, sendo nutrida por recortes de cenas, memes e dos poucos minutos que a mídia regular vende para o pronto consumo.
Como a oposição com conteúdo e responsabilidade social, não se mete nesse show de hipocrisia e ineficiência que é a CPI da Covid19, concluo que, teremos “pizza”, mas sem dança, apenas uma micro parcela do eleitorado poderá ser alcançada com as difíceis teorias impostas pelos senadores da CPI, senadores protegidos pelos seus 8 anos de mandato demonstram despreparo comum e apequenam o papel do Senado, o Brasil continuará sem nenhuma resposta efetiva ou apuração necessária, e o “crime” atribuído ao presidente será o de ser aconselhado por pessoas com visões das quais parte da política e da imprensa não concordam. Perdemos a chance de agir com seriedade e resultado real.
Caio Sousa
Professor Universitário, Advogado, Mestre em Ciências Jurídico Políticas, Especialista em Direito Municipal, Membro da Comissão de Direito Parlamentar da OAB/PE, Pesquisador do grupo “Cidades Transparentes” do Labô da PUC/SP.