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Políticos para servir ou serem servidos?

Neste dia 15 de setembro, Dia Nacional do Cliente, venho falar da política, como o ato de pensar e agir para resolver os problemas da vida em sociedade garantindo segurança no exercício das liberdades individuais, a qual, quando é exercida pelo Estado através dos 3 poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), deixa de ser uma opção dos que se apresentam para ocupar funções públicas/políticas, e passa a ser um dever servir ao interesse público em busca do bem comum.

Todos podemos ser considerados políticos, principalmente quando podemos escolher participar dos debates e proposituras das questões da vida em sociedade, no entanto, aqueles que resolvem se candidatar para um mandato eletivo, ou até mesmo os que optam por ocupar cargos público pela via do concurso ou da indicação, devem obrigatoriamente compreender que estão se apresentando para servir e não para se servir ou almejar regalias e enriquecimento às custas do dinheiro público.

No Brasil vivemos uma famigerada herança cultural de que prefeitos, presidentes, governadores, ministros, secretários, diretores, deputados, senadores, vereadores, juízes, promotores, delegados, militares de alta patente, seriam pessoas que, por carregarem grandes fardos de responsabilidades e cobranças, além de merecerem elevados salários que fogem à realidade financeira do cidadão comum, no nosso imaginário, ou no imaginário deles, devem ser prestigiados com gratificações, auxílios, benefícios, penduricalhos que tornam os volumosos salários desses grupos, quase que intocáveis pela vida cotidiana, é como se, a função pública de julgar, legislar, governar, investigar, segurar, justificasse o uso de dinheiro público para privilégios de poucos.

Imagine você que está lendo, se for uma pessoa “comum”, que não se encaixa dentre esses personagem políticos que citei, certamente ao começar a trabalhar em qualquer lugar, terá que inicialmente arcar com o seu transporte, der repente arcar com um financiamento de veículo, alimentação diária fora de casa, custear sua própria moradia, roupas, tratamentos médicos, dentista, necessitando inclusive de gastar com atualização profissional, custear sua própria promoção pessoal nas redes sociais, adequar qualquer compromisso a horários pré-estabelecidos, pagar seus impostos, e no final você, seja empregado ou autônomo, tem que bem servir à clientela.

Agora olhemos os ocupantes de algumas funções públicas/políticas, mas nos utilizemos de pitadas de ironia na leitura. É auxílio alimentação pra quem ganha mais de 20 mil, precisam garantir nutrição, locação de veículos para quem tem automóvel próprio e precisa ir trabalhar, afinal irá desgastar bem particular, apartamento funcional, motorista certamente para não prejudicar mais a saúde daqueles que são tão ocupados com os problemas públicos, celulares de ultima geração que obviamente são usados para só servir ao povo, gente paga por nós pra resolver questões de interesse particular desses seres especiais, férias de 2 meses, pagamento adicional em caso de convocações extraordinárias, auxílio paletó, cartão corporativo para despesas como um lanchinho no meio do dia, tudo um sonho brasileiro onde a maioria de nós, certamente não negaria, afinal, quem não gosta do “bem bom”. E ainda existem corruptos nesse meio, acreditem!

Conheço vários políticos e servidores representantes dos poderes, que de fato trabalham de forma árdua e incansável, alguns com jornadas que vão muito além de 44 horas semanais, magistrados, parlamentares, governantes que entendem o sentido da expressão servir, e assim servem com seu tempo e talento para o papel que desempenham, o que em tese, justificaria as “regalias” que são atreladas aos seus cargos, fazendo com que a maioria não queira abrir mão daquilo que a lei culturalmente e equivocadamente lhe atribuí por direito.

Ocorre que, o corporativismo presente entre grande parte dos ocupantes dessas funções, faz com que, em tempos de crise financeira, sequer se cogite retirar ou diminuir os ditos “direitos”, mesmo estes sendo um luxo numa sociedade de miseráveis, o que é agravado, quando são os próprios governantes, legisladores, e o judiciário que podem decidir, mesmo que parcialmente, se cortam ou não despesas na própria carne. Ao lugar de apenas servir, optam pelo histórico clientelismo tupiniquim.

Em Pernambuco, por exemplo, de 2020 para 2021 já percebemos aumentos de auxílios para magistrados de 2º grau, licitações de alimentação interna com itens não essenciais, contratação de aluguel de novas frotas de veículos, elevação da possibilidade de gastos com atividade parlamentar, alguns vereadores e prefeitos participando de congressos com passagens e diárias de hotel bancados com dinheiro público, quando tudo poderia ser online e home office, ampliando assim as regalias de poucos, num estado campeão de desemprego, de aumento da população em situação de rua e que já vem de uma história marcada pela reverências aos coronéis, sejam elas governantes, empresários ou pretensos servidores dos outros poderes.

Apenas pra você ficar ciente, está em tramite no congresso a PEC 32, que traz a reforma administrativa para todo o Brasil, ocorre que, a lista das funções intocáveis e privilegiadas continua a mesma, vindo a reforma proposta pelo governo federal e alterada pelos parlamentares federais, apenas atingir futuros servidores que, tirando algumas funções específicas, são os que menos impactam financeiramente os cofres públicos se observamos o custo dos penduricalhos e benefícios que já listei neste artigo. Vem aí uma PEC que não mexe com quem é privilegiado às nossas expensas.

Pergunto: Quando nossa cultura política irá mudar? Quando veremos mais partidos obrigando seus políticos a abrir mão de tantas benesses? Quando o povo deixará de olhar a política como meio de se servir frente ao seu abandono e necessidade? Quando as outras veneradas funções dos poderes da república quebrarão o ciclo vicioso do egoísmo corporativo e proporão o fim desses privilégios?

Admiro o exemplo bíblico de Jesus Cristo, quando no livro de Mateus 20:28 afirma que: “o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir, e para dar a sua vida em resgate de muitos.”. Ora, além da pregação de salvação, a mensagem do cristianismo é própria para o enquadramento da ação política na vida em sociedade, onde o ser líder, vem pelo servir, não pelo ser servido, onde o ocupar uma espaço de relevância social não pode representar um bônus financeiro custeado pelos nossos impostos, é um ônus que pode ser escolhido ou não, mas que impõe aos “corajosos” o dever de pensar as mazelas da sociedade, do carregar responsabilidades com o bem comum, um exercício de altruísmo, que deve se muito mais pautado no mordomo que serve a mesa, do que no cliente que é servido.

Caio Sousa
Advogado, Professor Universitário, Mestre em Ciências Jurídico Políticas pela Universidade de Lisboa, Especialista em Direito Municipal, Pesquisador do Labô – PUC/SP.

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